Lisandro Massanori Sakata
DOI: 10.17545/e-oftalmo.cbo/2015.7
Este estudo clínico randomizado realizado em Hong Kong compara a eficácia da Facoemulsificação (FACO) vs. Trabeculectomia (TRAB) no tratamento de pacientes com glaucoma de ângulo fechado (GAF), com pressão intraocular (PIO) descontrolada e sem catarata visualmente debilitante. Apesar de publicado em 2013, a inclusão deste artigo no e-oftalmo.cbo se justifica devido á relevância clínica na nossa prática diária. Os resultados e conclusões deste estudo merecem ser discutidos para que a conduta frente a esses pacientes seja feita de maneira adequada.
Um total de 26 pacientes com GAF foram randomizados para o grupo da FACO, e 24 para o grupo da TRAB com mitomicina (0.4mg/ml, 2-3 minutos). Todos apresentavam iridotomia patente, neuropatía óptica glaucomatosa, defeitos de campo visual consistentes com glaucoma, e uma PIO média acima de 24 mmHg sob uso de mais de três drogas. Um cirurgião experiente em GAF realizou todas as cirurgias, e os pacientes foram seguidos de 3/3 meses por um período de dois anos.
Os principais achados observados foram a redução da PIO tanto no grupo da FACO (pré 24.1+4.1 vs. pós 24 meses 15.9+3.9 mmHg) como no grupo da TRAB (pré 24.8+3.4 vs. pós 24 meses 15.8+4.3 mmHg), as custas de mais drogas antiglaucomatosas sendo utilizadas no grupo da FACO (média drogas FAC01.5 vs. TRAB 0.4). O grupo da TRAB apresentou significativamente mais complicações que o da FACO, e necessitou de procedimentos como curativos compressivos, injeções de 5FU e agulhamentos. Entretanto, nenhuma complicação dos dois grupos resultou em pior prognóstico visual ao final do estudo. Segundo o estudo, 8 (33%) olhos do grupo da TRAB apresentaram catarata e 5 aceitaram ser submetidos a FACO; e um total de 5 (20%) dos pacientes do grupo da FACO apresentaram descontrole pressórico mesmo sob tratamento clínico, sendo que 3 aceitaram ser submetidos a TRAB.
Os autores concluem que a FACO isolada pode ser uma alternativa à TRAB no tratamento cirúrgico inicial de casos de GAF com PIO descontroladas, mesmo sem a presença de catarata visualmente debilitante.
Entretanto, é importante enfatizar que a indicação cirúrgica inicial depende da avaliação individual da gravidade da neuropatía óptica glaucomatosa e da gravidade do dano do processo de fechamento angular (extensão das sinequias anteriores periféricas).
Em dados apresentados no site da revista (não publicados no corpo do artigo), os pacientes apresentavam glaucoma moderado a avançado em ambos os grupos (MD médio FACO -18.8 db e TRAB -19.8 db), e extensas áreas de sinequias anteriores (FACO 274o e TRAB 277o). Até que se prove o contrário, a FACO isolada não é capaz de quebrar sinequias anteriores periféricas. Assim, é improvável que a FACO consiga obter controle pressórico adequado em olhos com o sistema de drenagem tão comprometido (e com PIO de 24 mmHg sob uso de mais de três drogas). Os autores não fazem nenhum comentário sobre a extensão de sinequias pós FACO. Associado a esse raciocínio, pode-se dizer que existe um consenso entre especialistas em glaucoma que casos de glaucoma avançado com PIO média de 24mmHg (sob uso de >3 drogas) necessitam de procedimentos cirúrgicos antiglaucomatosos (exemplo: TRAB), pois a falha em obter o controle pressórico após FACO isolada em olhos com neuropatía glaucomatosa grave pode resultar em perda irreversível da visão.
Esses dois argumentos baseados em conhecimento e experiência prévia fazem frente aos resultados deste estudo clínico randomizado, particularmente considerando as implicações sérias e irreversíveis na visão desses pacientes. Em nossa opinião, este estudo necessita ser replicado por outros grupos, com um número de amostra adequado, e uma melhor caracterização dos pacientes avaliados, antes e após os procedimentos.
Fonte de financiamento: declaram não haver.
Conflito de interesses: declaram não haver.
Recebido em:
24 de Dezembro de 2014.
Aceito em:
30 de Janeiro de 2015.