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Opinião de Especialistas

Lentes progressivas com surfaçagem de forma livre

Progressive addition lenses with free-form surfacing

Lentes progresivos con tallado de forma libre

Celso Marcelo Cunha

DOI: 10.17545/eoftalmo/2017.115

RESUMO

O uso dos óculos com lentes progressivas é a correção óptica mais utilizada nos présbitas amétropes nas últimas décadas. O processo de fabricação dessas lentes passou por uma inovadora transformação com a chegada da surfaçagem de forma livre. Vários aspectos são abordados nesta revisão sobre essas novas lentes.

Palavras-chave: Lentes; Refração; Presbiopia.

ABSTRACT

In recent decades, progressive lenses have become the most commonly used optical correction for emmetropic presbyopic individuals. The manufacturing process of PLs underwent an innovative change with the development of the freeform surface design. Several characteristics of PLs are covered in this review.

Keywords: Lenses; Refraction, Ocular; Presbyopia.

RESUMEN

El uso de lentes progresivos es la corrección óptica más utilizada en los présbitas amétropes en las últimas décadas. El proceso de fabricación de esos lentes pasó por una innovadora transformación con la llegada del tallado de forma libre. Se abarcan varios aspectos en esta revisión sobre dichos lentes.

Palabras-clave: Lentes, Refración Ocular; Presbiopía.

As lentes progressivas (LP) caracterizam-se por terem seus campos de visão longe, intermediário e de perto sem linhas divisórias entre eles, porém, para terem este aumento gradual e contínuo do poder esférico, são necessárias mudanças de curvaturas em uma das superfícies, que vão gerar os astigmatismos induzidos (AI) nas laterais do corredor progressivo, independente de sua evolução, contudo com distribuição e poderes variados de acordo com o desenho proposto.1

Essas lentes evoluíram passando por diversas gerações, sendo que, até a sexta geração, mantinha-se o processo de fabricação por surfaçagem convencional, e, somente a partir da sétima geração, apresentou-se a atual surfaçagem de forma livre (representada por diversos fabricantes com outras sinonímias ainda pouco formalizadas: surfaçagem digital, surfaçagem 3D, surfaçagem free form, etc).

A surfaçagem de forma livre (SFL) é um processo de confecção das superfícies das lentes, e tem sido o foco de discussões dos fabricantes de LP no mundo, haja vista que aquela entrou no mercado dos EUA e Brasil há poucos anos. No modo de fabricação convencional das LP, elas são produzidas a partir da injeção de resina líquida em moldes, que, com seu endurecimento, fazem surgir as curvas progressivas complexas dessas lentes. Por outro lado, a SFL é um processo de desbaste nos 3 eixos (X, Y e Z), baseando-se em um tripé: maquinário de SFL (Figura 1), um software e um projeto de LP. Esses maquinários conseguem, em cerca de 60 segundos, gerar, com um bloco de visão simples, uma superfície progressiva complexa. 2

 


Figura 1. Broca diamantada da HSC Modulo Generator. (Fonte: SCHNEIDER Optical Machines).

 

As LP fabricadas por SFL podem ser produzidas com a superfície progressiva na face anterior da lente, na posterior, ou mesmo nas duas. Sem dúvidas, o processo de surfaçagem, na curva posterior das LP, ajuda a aumentar os campos intermediário e de perto dessas, pelo mesmo efeito que se tem com o ajuste do ângulo pantoscópico. As lentes com ambas as superfícies progressivas permitem dividir o projeto bidimensionalmente, com isso, corrigindo as aberrações horizontais posteriormente, e a vertical, na superfície anterior. Ao corrigir as horizontais posteriormente, manter-se-ia o benefício do efeito em buraco de fechadura, como da segunda geração, e, ao corrigir anteriormente as aberrações verticais, não se permitiria que o campo intermediário reduzisse o campo de perto, pois os campos guardam certa correlação e não se conseguiria grandes campos independentes em adições 2.00, ou maiores. 3,4,5 Alguns exemplos dessas lentes e local de suas progressões estão dispostos na tabela 1.

 

 

Às vezes, tem-se a ideia equivocada que a SFL poderia fazer de tudo na superfície de uma lente, porém isso depende do projeto e software utilizados, pois não é simplesmente passar de um projeto de superfície anterior para um de superfície posterior.

Os maiores benefícios das LP com SFL são:

• Curva base ideal sempre disponível.

• Descentração da distância nasopupilar (DNP) longe/perto de acordo com a convergência.

• Ajustes da altura do corredor progressivo.

• Ajustes dos prism thinning.

• Diminuição dos AI.

A disponibilidade da curva base ideal independente do estoque dessas LP já seria, para o setor óptico, uma razão inquestionável da importância das SFL em relação às convencionais. Pensava-se que as mudanças na curva base propostas pela teoria de Tscherning pudessem somente diminuir as aberrações astigmáticas, que ocorrem pela passagem da luz pela lente de forma oblíqua, todavia estudos recentes apontam que as curvas ideais diminuem os AI e aumentam os campos de visão, principalmente, do campo de perto das LP. 6

Os ajustes das descentrações das DNP longe e perto são as formas mais palpáveis da evolução dessas lentes. As LP convencionais apresentam convergência fixa de acordo com seu projeto, geralmente, 2,5 mm para cada lente. A população présbita brasileira tem distância pupilar (DP) em média de 65 e 62 mm, masculino e feminino, respectivamente; e, com pequenas ressalvas de outros fatores que alteram a convergência, esses pacientes, comumente, convergem os 5 mm quando usam sua visão de perto. Isto permite que, neste aspecto, tenha-se a mesma funcionalidade entre as LP com SFL e convencional. Porém isso é apenas a média da população, sendo que 34% da população feminina estudada, recentemente, demostrou ter convergência diferente de 5 mm, que permitiria maiores áreas de equilíbrio binocular no campo de perto nas LP fabricadas com SFL. 7

Os ajustes aos hábitos de vida podem ser sugeridos, deixando o início da progressão mais baixa, por exemplo, para aqueles que usam muito a visão de longe, por exemplo. Assim como a redução da altura do corredor em armações mais curtas horizontalmente.

O maior controle no desbaste prismático (prism thinning) permite a fabricação de LPs muito mais finas e leves, bem como melhorar o equilíbrio prismático nas anisometropias com slab-off, que é o ajuste da indução prismática no campo de perto das LP, que está em torno de 8 a 12 mm distante do ponto de equilíbrio prismático dessas. 8

A redução dos AI e, por conseguinte, o aumento das áreas uteis de visão das LP completam essa lista de melhorias.

Além de todos esses benefícios, os desenhos das LP fabricadas com SFL podem ser personalizados (customizados, individualizados) para cada paciente. Esses ajustes podem ser relacionados à própria refração prescrita, à armação escolhida e aos hábitos de vida do usuário. Estudos já apontam a superioridade dessas lentes em ensaios clínicos. 9,10

Cuidado especial deve ser considerado na conferência dessas lentes em lensômetros comuns. Ao descer o garfo de sustentação para medir, principalmente, o poder de perto, encontrar-se-ia valores dióptricos diferentes dos prescritos (Figura 2-A). Deve-se, neste caso, posicionar os óculos como eles ficariam à frente dos olhos dos usuários, sem baixar o garfo de sustentação (Figura 2-B). 11

 


Figura 2: A – LP posicionada de forma incorreta no lensômetro. B – LP posicionada corretamente para medir o poder real de perto.

 

REFERÊNCIAS

1. Sheedy JE, Campbell C, King-Smith E, Hayes JR. Progressive Powered Lenses: the Minkwitz Theorem. Optom Vis Sci. 2005;82(10):916-24.

2. Chamorro E, Alonso J, Cleva JM, Crespo D. Free-Form Lenses: Why My Patient is Not Wearing My Prescription? JOJ Ophthalmol. 2017;2(1):555577. DOI: 10.19080/JOJO.2017.02.555576

3. Huang C, Raasch TW, Yi AY, Bullimore MA. Comparison of progressive addition lenses by direct measurement of surface shape. Optom Vis Sci. 2013;90(6):563-75. DOI: 10.1097/OPX.0b013e3182923ff6

4. Cunha CM, Correia RJB, Sardinha Neto AA. Lentes progressivas – análise dos campos intermediário e de perto por deflexometria. Arq Bras Oftalmol. 2013;76(1):33-7. DOI: 10.1590/S0004-27492013000100010

5. Sheedy JE. Progressive addition lenses – matching the specific lens to patient needs. Optometry. 2004;75(2):83-102. DOI: 10.1016/S1529-1839(04)70021-4

6. Arroyo R, Crespo D, Alonso J. Influence of the base curve in the performance of customized and classical progressive lenses. Optom Vis Sci. 2013;90(3):282-92. DOI: 10.1097/OPX.0b013e3182814d85

7. Cunha CM, Correia RJB. Distância interpupilar e convergência na população présbita. Rev Bras Oftalmol. 2015;74(5):303-5. DOI: 10.5935/0034-7280.20150062

8. McCarthy P. Anisometropia: what difference does it make? Optom Pract. 2013;14(1):1-10 [acesso 2017 Dec 8]. Disponível em: https://pdfs.semanticscholar.org/ba16/b53e72ed321609f60ebba965bb58582676f9.pdf

9. Han SC, Graham AD, Lin MC. Clinical assessment of a customized free-form progressive add lens spectacle. Optom Vis Sci. 2011;88(2):234-43. DOI: 0.1097/OPX.0b013e31820846ac

10. Forkel J, Reiniger JL, Muschielok A, Seidemann A, Baumbach P. Personalized Progressive Addition Lenses: Correlation between Performance and Design. Optom Vis Sci. 2017;94(2):208-18. DOI: 10.1097/OPX.0000000000001016

11. Meister DJ, Fisher SW. Progress in the spectacle correction of presbyopia. Part 2: Modern progressive lens technologies. Clin Exp Optom. 2008;91(3):251-64. DOI: 10.1111/j.1444-0938.2008.00246.x

 

 

Fontes de Financiamento: Declaram não haver

Aprovação CEP: não aplicável

Conflito de Interesses: Declaram não haver

Recebido em: 22 de Novembro de 2017.
Aceito em: 6 de Dezembro de 2017.


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