Carolina Zuccolotto Pereira1; Bárbara Palma Saccon1; Jéssica Queiroz Soares1; Dayane Cristine Issaho1,2
DOI: 10.17545/eOftalmo/2023.0047
RESUMO
O presente estudo relata o caso de um paciente, masculino, 36 anos, com estrabismo incomitante e posição viciosa de cabeça com mento deprimido para aliviar sintoma de diplopia. Paciente foi submetido à cirurgia combinada (recuo-ressecção) do músculo reto inferior esquerdo. O objetivo desta técnica cirúrgica é a correção do desvio em sua posição de maior incomitância, sem prejudicar o alinhamento ocular na posição primária do olhar. Atualmente vem se concretizando como uma alternativa segura para casos de estrabismo incomitante horizontal e vertical, oferecendo um bom desfecho cirúrgico.
Palavras-chave: Estrabismo incomitante; Recuo-ressecção; Diplopia; Eelato de caso.
ABSTRACT
The present study reports the case of a 36-year-old male patient with incomitant strabismus and anomalous head posture with depressed chin to relieve symptoms of diplopia. He was submitted to a combined surgical approach (recession-resection) of the left inferior rectus muscle. The purpose of this surgical technique is to correct the deviation in its most incomitant position, with no damage to ocular alignment in the primary gaze position. It has shown to a safe alternative for cases of incomitant horizontal and vertical strabismus, offering good surgical outcomes.
Keywords: Incomitant strabismus; Recession-resection; Diplopia; Case report.
INTRODUÇÃO
Pacientes com estrabismos incomitantes podem apresentar diplopia apenas em certas posições do olhar. Um subconjunto desses pacientes pode apresentar uma situação clínica única em que o paciente é assintomático ou livre de diplopia na posição primária, mas apresenta diplopia em posições de olhar secundárias funcionalmente importantes, como na infraversão (para leitura) ou lateroversões (para dirigir)1.
As principais causas de desvios horizontais incomitantes são as paresias musculares, restrições oculares, divergência horizontal dissociada, relação convergência acomodativa/acomodação (CA/A) alta ou cirurgias prévias2. Poucas técnicas cirúrgicas foram propostas para a correção de tal, e, eventualmente, os resultados são insatisfatórios - apresentando hipocorreção ipslateral ao músculo previamente afetado e hipercorreção no campo contralateral3.
Tradicionalmente esses pacientes têm sido submetidos à cirurgia de Faden (mioescleropexia retroequatorial), proposta por Cuppers em 1976, que consiste em uma fixação do músculo extraocular na esclera posterior ao equador, sem realizar sua desinserção da esclera4,5.
A cirurgia de Faden objetiva diminuir a rotação máxima do olho, através da fixação do músculo posterior ao equador, criando uma nova inserção para a ação de rotação do músculo. Com influência mínima ou nenhuma nas outras posições fora da ação deste músculo5.
Scott, em 1994, descreve uma nova técnica, na qual se cria o efeito da fixação posterior, sem a colocação de suturas. Nesta técnica, uma porção do músculo é ressecada e o mesmo músculo é recuado. Este recuo deve ser maior ou igual à ressecção, para poder produzir uma diminuição seletiva da função do músculo em seu campo de ação6.
O objetivo do presente estudo foi relatar o caso de um paciente com estrabismo incomitante e a abordagem cirúrgica combinada (recuo-ressecção) do mesmo músculo extraocular como proposto por Scott.
RELATO DE CASO
Paciente masculino, 36 anos, queixou-se que há 4 meses iniciou diplopia ao olhar para baixo. Ao exame oftalmológico acuidade visual 20/20 em ambos os olhos com correção (OD +1,00 -5,00 165º e OE +0,25 -1,75 35º), posição viciosa de cabeça com mento deprimido para aliviar sintomas de diplopia. Biomicroscopia e fundo de olho sem alterações. Ao exame da motilidade ocular extrínseca (MOE) apresentava discreta hipofunção (1-/4-) dos músculos: reto inferior direito (RID) e oblíquo superior direito (OSD) na infraversão. O exame de prisma e cover alternado com correção está descrito na tabela 1.
Sem alterações na investigação neurológica. Ressonância magnética de crânio e órbitas não mostrou alterações anatômicas da musculatura extraocular.
Optou-se pela cirurgia de recuo de reto inferior do olho esquerdo de 6mm e ressecção de reto inferior do olho esquerdo de 3mm.
No primeiro dia pós-operatório o paciente se manteve com hipertropia do olho direito de 6 Dp na infraversão e nas demais posições estava ortofórico. Após 30 dias da cirurgia, o paciente manteve AV 20/20 em ambos os olhos com correção, no exame de prisma e cover alternado com correção estava ortofórico nas 9 posições do olhar, com um follow-up de 4 meses mantendo-se estável. O paciente ficou satisfeito com resultado cirúrgico.
DISCUSSÃO
A cirurgia com uso da técnica de recuo e ressecção do mesmo músculo proposta inicialmente por Scott vem se concretizando como uma alternativa segura para casos de estrabismo incomitante, horizontal e vertical. Ela visa enfraquecer o músculo em seu campo de ação sem que haja alteração significativa na posição primária do olhar6.
A proposta inicial de Scott era a de uma grande ressecção, porém Bock et al propuseram diminuir a porção ressecada do músculo, pela impossibilidade de prever os efeitos a longo prazo7.
Bock et al. concluíram que este é um procedimento seguro para estrabismos incomitantes em que os retos laterais estejam envolvidos, possibilitando também a utilização de suturas ajustáveis para eliminar o problema da fixação posterior, porém, para os outros músculos, concluiu não ter experiência suficiente para julgar a eficácia do procedimento7.
O paciente submetido a este procedimento possuía dificuldade para leitura, pois a diplopia ocorria apenas em infraversão, sem queixas em outras posições. Reduziu-se o desvio de forma significativa, sendo o resultado encontrado após 4 meses satisfatório tanto para o cirurgião quanto para a paciente.
REFERÊNCIAS
1. Thacker NM, Velez FG, Rosenbaum AL. Combined adjustable rectus muscle resection--recession for incomitant strabismus. J AAPOS. 2005 Apr;9(2):137-40.
2. Souza-Dias C, Prieto-Diaz J. Cirurgia do estrabismo. In: Prieto-Diaz J, Souza-Dias C. Estrabismo. 4a ed. São Paulo: Santos; 2002. p.475-7.
3. Ribeiro GB, Almeida HC, dos Santos EM. New surgical aproach in the treatment of incomitant strabismus: case report. Arq Bras Oftalmol. 2006;69(4):585-8.
4. Cuppers C. The so-called fadenoperation: surgical corrections by small-defined changes of the arc of contact. In: Fells P, editor. The 2nd congress of the International Strabismology Association. Marseilles (France): Diffusion Generale de Librairie; 1976. p. 395.
5. von Noorden GK. Binocular vision and ocular motility: theory and management of strabismus. St Louis (MO): Mosby-Year Book; 1978.
6. Scott AB. Posterior fixation: adjustable and without posterior sutures. In: Lennerstrand G, editor. Update on strabismus and pediatric ophthalmology: Proceedings of the june 1994 Joint ISA and AAPO&S Meeting. Vancouver, Canada. Boca Raton (FL): CRC; 1995. p.399.
7. Bock CJ Jr, Buckley EG, Freedman SF. Combined resection and recession of a single rectus muscle for the treatment of incomitant strabismus. J AAPOS. 1999;3(5):263-8.
INFORMAÇÃO DOS AUTORES |
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» Carolina Zuccolotto Pereira https://orcid.org/0000-0003-3675-4691 http://lattes.cnpq.br/1322624712208002 |
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» Bárbara Palma Saccon https://orcid.org/0000-0002-3922-4939 http://lattes.cnpq.br/2514218750645064 |
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» Jéssica Queiroz Soares https://orcid.org/0000-0003-2972-0557 http://lattes.cnpq.br/5911891259820431 |
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» Dayane Cristine Issaho https://orcid.org/0000-0001-8572-5980 http://lattes.cnpq.br/7586438822727319 |
Financiamento: Declaram não haver.
Conflitos de Interesse: Declaram não haver.
Recebido em:
10 de Janeiro de 2023.
Aceito em:
24 de Setembro de 2023.