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Casos Clínicos Discutidos

Abordagem terapêutica no tumor vasoproliferativo da retina

Therapeutic approach for retinal vasoproliferative tumor

Abordaje terapéutico en tumor vasoproliferativo de la retina

Roberta C. Bonanomi1; Maria T. B. C. Bonanomi2; Otacilio O. Maia3; Sergio L. G. Pimentel4

DOI: 10.17545/eoftalmo/2018.0027

RESUMO

O tumor vasoproliferativo (TVP) é uma entidade com apresentação multifacetada cujo diagnóstico pode ser desafiador e a conduta deve ser personalizada. Apresentamos nesse artigo dois relatos de caso, um primário e um provavelmente secundário segundo sua manifestação clinica e história. Ambos os casos com sucesso cirúrgico após a conduta semelhante em alguns aspectos. Ressaltamos a importância da personalização do tratamento levando-se em conta além das características do paciente e do tumor, os recursos disponíveis.

Palavras-chave: Cirurgia Vitreorretiniana; Descolamento Retiniano; Edema Macular; Neoplasias da Retina; Telangiectasia Retiniana.

ABSTRACT

Vasoproliferative tumor (VPT) is characterized by variable presentation, and its diagnosis can be challenging, indicating that the therapeutic approach should be individualized. Herein, we report two cases, one case of primary VPT and another probable case of secondary VPT based on clinical presentation and history. Notably, a similar surgical procedure was successfully used in both cases. The results demonstrate the importance of individualizing treatment considering patient and tumor characteristics and the available resources.

Keywords: Vitreoretinal Surgery; Retinal Detachment; Macular Edema; Retinal Neoplasms; Retinal Telangiectasis.

RESUMEN

El tumor vasoproliferativo (TVP) es una entidad con presentación multifacética del cual el diagnostico puede llegar a ser desafiador, por ello la actitud de la terapia debe de ser personalizada. Se presenta en este artículo dos relatos de caso, uno de ellos primario y el otro probablemente secundario, según su manifestación clínica e histórica. En los dos casos hubo éxito quirúrgico tras la conducta semejante en unos aspectos. Se llama la atención a la importancia de que esa terapia sea personalizada, teniéndose en cuenta las características del paciente y del tumor, así como de los recursos disponibles.

Palabras-clave: Cirugía Vitreorretiniana; Desprendimiento de Retina; Edema Macular; Neoplasias de la Retina; Telangiectasia Retiniana.

INTRODUÇÃO

O Tumor Vasoproliferativo (TVP) não tem predominância por sexo e apresenta-se entre os 40 e 60 anos de idade. É uma doença considerada reativa que cursa com exsudação lipídica na retina, podendo ser idiopático (80% dos casos) ou secundário à uveíte, cirurgia, trauma, retinose pigmentar, retinopatia da prematuridade entre outros (20%).1,2,3 O quadro clínico é de baixa acuidade visual, “floaters” e fotopsia. À oftalmoscopia sua aparência é de lesão arredondada, elevada, de cor rósea amarelada com exsudatos duros, geralmente localizada na região pré-equatorial e inferotemporal da retina; esse tumor é constituído principalmente de células gliais, finos capilares e vasos sanguíneos hialinos ocluídos.1,2,4 Lesões múltiplas podem ser encontradas em 6% dos paciente sem doença ocular pré existente e 41% dos secundários.1 As complicações mais frequentes são o edema macular, descolamento de retina seroso e hemorragia vítrea,1,2 e os principais diagnósticos diferenciais são lesão disciforme, hemangioblastoma retiniano, melanoma amelanótico, hemangioma de coroide e doença de Coats.2

 

RELATO DE CASO

Caso 1: Homem pardo de 45 anos, com baixa de acuidade visual (AV) no OD há sete dias. AP: irrelevante; AV corrigida de 20/20- e 20/20, sem outras alterações exceto as do mapeamento de retina que mostrou descolamento de retina exsudativo periférico associado ao tumor vasoproliferativo no OD, confirmado pelo US. (Fig 1 A e B) Como o paciente era reator forte ao PPD, foi submetido a esquema tríplice por 3 meses sem haver modificação do quadro retiniano. Apesar de ter indicação de Braquiterapia, foi tratado apenas com criocoagulação inicialmente, e devido à exsudação residual e visão de 20/80, foi adotado o tratamento com antiangiogênico. Após três injeções mensais de Bevacizumabe houve reabsorção dos lípides e resolução do edema macular. Resultou com AV final de 20/25 e a mácula apresentava membrana epiretiniana ao OCT. (Figura 1 C-F).

 


Figura 1. A) Retinografia inicial do TVP com descolamento seroso, exsudação lipídica e hemorragia na superfície do tumor. B) USG do tumor C) Retinografia após crioterapia (resolução parcial) D) Primeiro OCT feito após crioterapia; E) OCT 30 dias após crioterapia A/V 20/80; F) OCT final após injeção de bavacizumabe, AV final 20/25; G) Retinografia final com absorção de todo lípide e resolução do descolamento seroso

 

Caso 2: Homem branco de 62 anos, atendido em abril de 2015, com baixa de AV no OD, portador de diagnóstico angiográfico de Doenca de Eales, relatava ter bronquite e diabetes mellitus leve, não necessitando de medicação. Ao exame apresentava: AV(corrigida): OD: 20/30+1 e OE: 20/20, sem alterações de segmento anterior e PIO de 14/16mmHg. Ao mapeamento de retina apresentava exame normal no OE e, no OD, descolamento exsudativo da retina com depósito de lípides até a mácula, diálise retiniana com descolamento de retina regmatogênico setorial adjacente e tumor vasoproliferativo (confirmado pelo US) na retina temporal inferior. (Figura 2 A-C) O tratamento planejado foi na sequência: Fotocoagulação da retina periférica em toda a circunferência na base vítrea (Figura1 G), após 3 meses introflexão escleral triancinolona 15 dias antes. O implante usado foi o 240 com “sleeve” largo no setor da diálise, com criocoagulação do tumor em dois ciclos de descongelamento.4 Após 2 meses, referindo piora da visão, apresentava AV de 20/60 com edema macular ao OCT. Tratado com 3 injeções mensais de Ranibizumabe com persistência do edema e agora com membrana epiretiniana macular. Em junho de 2016 o paciente foi submetido a Faco-vitrectomia com uso de triancinolona intra-operatória com resolução do edema. AAV final é de 20/30 e OCT demonstra edema macular residual, mas com depressão foveal presente. (Figura 2 D-F).

 


Figura 2. A) Retinografia diagnóstica apresentando exsudação lipídica e lesão periférica na retina, B) Angiofluoreceinografia mostrando lesão vascularizada com extravasamento do corante adjacente à linha de demarcação do descolamento regmatogênico (seta na figura B); C) USG com tumor e descolamento de retina plano; D) Retinografia após o tratamento; E/F) OCT realizado após 2 anos do inicio do quadro; apresentando cistos residuais, após membranectomia, visão final de 20/30.

 

DISCUSSÃO

O TVP pode ser classificado e abordado de diferentes formas.¹ Quanto à classificação, o caso 1 representa um exemplo de TVP primário, pois não foram encontradas alterações retinianas que não as relacionadas com o tumor, sendo o descolamento de retina (DR) seroso e a presença de lípides secundários à exsudação dos vasos sanguíneos tumorais. Já no caso 2 pode tratar-se de um TVP secundário a um DR regmatogênico com diálise periférica, já que podemos notar, no angiograma pré tratamento, o tumor vascular adjacente à linha de demarcação pigmentada que corresponde ao limite do DR. (figura 2, seta).

Quanto ao tratamento, a conduta terapêutica no TVP consiste em usar os métodos necessários para haver a esclerose dos vasos sanguíneos do tumor e consequentemente interromper a exsudação de líquido e lípides para dentro da retina e para o espaço sub-retiniano. No caso 2, a fotocoagulação da retina periférica normal foi realizada para proteção contra os efeitos colaterais da crioterapia forte que pode piorar a tração vítrea, e no caso, agravar o descolamento regmatogênico.

A conduta ideal no TVP ainda não foi determinada, diversos tipos de tratamento foram descritos com sucesso: crioterapia, fotocoagulação a laser, PDT, braquiterapia, rececção cirúrgica, injeção intravítrea, podendo ser usadas isoladamente ou em conjunto.2,5

De todos os descritos acima, a crioterapia parece ser a mais usada no tratamento do TVP,2 principalmente quando este está localizado na periferia da retina, (como nos dois casos aqui relatados). Muitas vezes são necessárias 2 ou 3 sessões para atingir quadro desejado. A técnica utilizada é congelamento e descongelamento da região do tumor 3 vezes; o descongelamento se inicia somente após espículas de vítreo congeladas poderem ser visualizadas através da oftalmoscopia indireta.3,5 Os efeitos adversos da crioterapia são persistência do edema macular e descolamento de retina regmatogênico devido à cicatriz formada e contração vítrea. A fotocoagulação a laser é sempre usada como complemento a outras terapias, visto sua ação limitada. No caso 2, o laser foi aplicado de forma circunferencial, estabilizando a retina normal antes do tratamento do tumor propriamente dito. Nota-se que em ambos os pacientes, a visão e o OCT macular iniciais são melhores que aqueles após o tratamento. Este fato deve ser explicado ao paciente, juntamente com o fato de a terapêutica ser longa e com diferentes procedimentos incluídos, ao se propor o tratamento. A injeção intravítrea de anti-VEGF ou triancinolona é usada como uma terapia adjunta, pois isoladamente não conseguem involuir o tumor. No caso 1, apesar do tratamento com criocoagulação ter encolhido o tumor, restava muita exsudação lipídica, que foi controlada com injeção de anti- angiogênico complementar; já no caso 2 foi necessário planejar o tratamento do TVP simultaneamente ao do DR regmatogênico, levando assim à escolha da introflexão escleral.

Braquiterapia é indicada para lesões maiores de 2,5mm de espessura, e lesões associadas a DR; nesse caso especifico, muitas vezes a crioterapia é mais danosa que benéfica, podendo levar à destruição tecidual, hemorragia vítrea e em alguns casos, aumento do líquido sub-retiniano; por esse motivo havia sido indicado no caso 1. Na braquiterapia são usados rutenio ou iodo, levando à remissão tumoral em 88% e 97% dos casos respectivamente. Essa eficácia diminui no caso de glaucoma neovascular associado. Os efeitos da radiação no olho são: olho seco, catarata, neuropatia ocular actinica e glaucoma neovascular.2

Ressecção cirúrgica é indicada quando a crioterapia não foi eficaz mesmo associada à injeção intravítrea, ou até mesmo como tratamento primário quando há múltiplos TVP ou HV.2,4

 

CONCLUSÃO

Enfatizamos a necessidade de se examinar a periferia da retina para diagnosticar o TVP quando há edema ou exsudação macular. Para o tratamento devemos usar todos os métodos descritos disponíveis com o objetivo de se obter a oclusão definitiva de todos os vasos sanguíneos tumorais.

 

REFERÊNCIAS

1. Shields CL, Kaliki S, Al-Dahmash S, Rojanaporn D, Shukla SY, Reilly B, et al. Retinal vasoproliferative tumors: comparative clinical features of primary vs secondary tumors in 334 cases. JAMA Ophthalmol. 2013;131(3):328-34.

2. Marback EF, Guerra RL, Maia Jr OO, Marback RL. Retinal vasoproliferative tumor. Arq Bras Oftalmol. 2013;76(3):200-3.

3. Shields CL, Shields JA, Barrett J, De Potter P. Vasoproliferative tumors of the ocular fundus. Classification and clinical manifestations in 103 patients. Arch Ophthalmol. 1995;113(5):615-23.

4. Damato B. Vasoproliferative retinal tumour. Br J Ophthalmol. 2006;90(4):399-400.

5. Shields JA, Parsons H, Shields CL, Giblin ME. The role of cryotherapy in the management of retinoblastoma. Am J Ophthalmol. 1989;108(3):260-4.

 

Fonte de financiamento: declaram não haver

Parecer CEP: não aplicável

Conflito de interesses: declaram não haver

Recebido em: 4 de Junho de 2018.
Aceito em: 13 de Junho de 2018.


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